Uma Bitch Power Condenada pelos Pecados do Pai
BITCH POWER n. 17
Bloody Mary – A Rainha Louca e Sanguinária da Inglaterra
Texto e Imagens: Rodrigo A. Silva
Revisão e Arranjo de Imagens: Alessandro Chmiel
E-mail: [email protected]
Dedico este artigo ao meu mais novo camarada xenite Alessandro Chmiel que me deu a oportunidade de escrever na coluna Bitch Power deste mês. Também quero fazer um agradecimento especial a Mary Anne, que permitiu a minha participação na revista em primeiro lugar e dizer que para mim é um privilégio estar aqui.
Arquivo Histórico:
Nome: Mary Tudor
País: Inglaterra
Data de Nascimento: 18/02/1516
Pai: Henrique VIII
Mãe: Catarina de Aragão (1ª esposa de Henrique VIII)
Irmã: Elizabeth I (filha de Ana Bolena – 2ª esposa de Henrique VIII)
Irmão: Eduardo VI (filho de Jane Seymour – 3ª esposa de Henrique VIII)
Marido: Filipe II (rei da Espanha)
Nossa mais recente Bitch Power não saiu das páginas de um livro de ficção, nem das telas do cinema, muito menos dos jogos de RPG. Bloody Mary saiu diretamente das páginas intangíveis da História para as páginas digitais da Revista Xenite do mês de junho.
A vida da jovem princesa Mary Tudor era celebrada por todos os súditos da Inglaterra como um verdadeiro milagre, pois naquela época a mortalidade infantil era enorme e dos cinco filhos que o rei Henrique VIII teve com sua esposa Catarina, Mary foi a única que chegou a idade adulta com vida.
Por ser a única filha do rei e consequentemente a única herdeira oficial do trono da Inglaterra, Mary recebeu a melhor educação possível para a época, aprendeu a falar Italiano, Espanhol, Francês, Latim, Grego e ainda teve aulas de Ciências, Teologia e Música. Além disso, recebeu do pai um castelo só para ela com súditos que deveriam servi-la e mima-la incondicionalmente. Sempre cercada de mimos e privilégios, a vida da jovem princesa era um verdadeiro conto de fadas.
A Mary desta época era uma jovem doce e inteligente, tão doce e misericordiosa como Callisto devia ser antes da Evil Xena ter destruído sua aldeia e matado seus pais. Mas se Mary era assim tão doce, então como ela se tornou uma bitch?
Como acontece na maioria dos contos de fadas, uma madrasta malvada sempre acaba se casando com o rei e fazendo da vida da jovem princesa um verdadeiro inferno. Nesse caso não foi diferente. O rei estava muito insatisfeito com o fato de não ter um herdeiro homem para assumir o trono e, como todo machista, o rei Henrique VIII pôs a culpa em sua esposa Catarina e chegou ao ponto de levá-la a julgamento por causa disso. A verdadeira intenção do rei nesse julgamento era provar a todos que Catarina não era capaz de gerar um filho homem e que por esse motivo ele teria todo o direito de anular seu casamento com ela e se casar com outra mulher. Isso foi um escândalo, pois na época não existia divórcio, o casamento realmente deveria durar “até que a morte os separasse”. Como a Igreja Católica não aceitou o pedido de anulação do casamento, o rei Henrique VIII decidiu romper relações com o Papa e expulsou a Igreja Católica Apostólica Romana da Inglaterra, criando assim a sua própria igreja, a Igreja Anglicana, na qual o rei era o líder absoluto (religioso e político) e onde a anulação dos casamentos era permitida. Com isso, o rei Henrique VIII conseguiu anular seu casamento com Catarina e se casou com outra mulher, uma jovem dama da corte chamada Ana Bolena.
Foi a partir daí que o tormento da princesa Mary começou. Quando o casamento de seus pais foi anulado, oficialmente falando, Mary passou a ser uma filha ilegítima, uma bastarda gerada fora do casamento oficial do rei. Isso fez com que ela perdesse automaticamente o título de princesa, seu castelo particular, seus súditos, seus mimos e o direito de se tornar rainha algum dia. Quase que da noite para o dia, Mary passou de princesa da Inglaterra a babá de Elizabeth, sua meio-irmã recém nascida, filha do rei com sua nova esposa, e era agora conhecida por todos apenas com Lady Mary, a filha bastarda do rei. Além disso, Mary foi proibida de visitar sua mãe, a ex-rainha Catarina de Aragão, que havia sido banida e isolada dentro de um convento onde permaneceu até morrer de tristeza. Esse fato em especial foi um dos mais tristes para Mary, pois o rei não permitiu que ela fosse nem mesmo ao enterro da própria mãe.
O rei Henrique VIII ainda precisou de alguns anos e de mais dois casamentos mal resolvidos para finalmente conseguir o seu tão sonhado herdeiro, o príncipe Eduardo VI. Infelizmente, o jovem príncipe sempre foi muito fraco e doente e morreu pouco tempo depois de se tornar rei. Finalmente havia uma chance de Mary mudar a história trágica de sua vida e se reerguer como a primeira rainha mulher de toda a história da Inglaterra, mas isso não foi tão fácil como parecia. Os deuses nórdicos da guerra não pareciam estar muito a favor de Mary e uma prima dela, Lady Jane Grey, assumiu o trono em um golpe de Estado. Com o apoio dos súditos que ainda eram leais à memória do rei Henrique VIII, Mary recuperou o trono e mandou executar sua prima traidora e todos aqueles que fizeram parte do golpe.
Mary sempre foi muito religiosa e logo após se tornar rainha trouxe a Igreja Católica de volta a Inglaterra, tornando novamente o catolicismo a religião oficial do país. Este ato provocou um grande conflito de interesses em seu governo, já que os nobres mais poderosos haviam se convertido completamente à nova religião anglicana, o que gerou novas tentativas de golpes de Estado para derrubar a soberania da rainha.
Todas essas conspirações internas, o rancor que Mary nutria em relação à Igreja Anglicana que seu pai fundou e toda a humilhação que Mary sofreu por causa disso, fizeram com que ela se tornasse uma mulher paranóica e começasse a perder pouco a pouco sua sanidade. O medo que ela tinha de seus perseguidores protestantes (pessoas que não eram católicas), somado ao seu fanatismo religioso, fizeram com que ela tomasse a decisão de perseguir e executar todos aqueles que ela considerava “hereges”. Deste modo, como se tivesse sido tomada pela loucura das Fúrias, a rainha Mary I executou cerca de trezentas pessoas durante suas perseguições e por esse motivo recebeu o apelido pelo qual a conhecemos hoje: Bloody Mary (Maria, a Sanguinária).
A rainha Mary I morreu aos 42 anos de idade com um tumor no estômago (que ela acreditou até o último instante de vida ser um bebê, mesmo não tendo relações com o marido há séculos). Em um de seus delírios e sob influência do marido canalha, chegou a mandar prender a própria irmã caçula, Elizabeth, em uma torre no castelo, acreditando que essa estava armando uma conspiração para matá-la.
A história da rainha Mary I, assim como a história de toda a família Tudor, é muito extensa e complexa, tornando impossível compactá-la em um único artigo. Podemos considerar que a rainha Mary I foi uma Bitch Power pelo fato de ela ter sido uma das mulheres mais poderosas de sua época e por ter utilizado esse poder para massacrar centenas de vidas humanas, mas não podemos deixar de levar em consideração que ela era uma sanguinária em um mundo composto por pessoas sanguinárias.
Gostaria de poder comparar Bloody Mary a um personagem mais específico do xenaverse, mas o único comparativo que pude observar foi com uma pobre e infeliz vítima da punição das Fúrias. Como todos vocês bem sabem, as Fúrias condenam suas vítimas com perseguição e loucura, não por elas terem cometido algum crime diretamente, mas pelos pecados de seus pais.
Na série, Xena foi condenada pelas Fúrias com perseguição e loucura pelo suporto crime de assassinato que sua mãe teria cometido contra seu pai. Neste caso, acredito que mais uma vez a vida imita a arte, pois a Bloody Mary pode muito bem ter sido punida pelas Fúrias com perseguição e loucura devido aos crimes que o próprio pai cometeu contra a mãe dela, levando-a indiretamente a morte.
Mesmo imersa em sua loucura, Xena conseguiu enganar as Fúrias e se libertar de sua punição, mas a rainha Mary não teve essa oportunidade, talvez por não se dar conta de que estava louca ou talvez porque os crimes de seu pai foram tão terríveis a ponto de seus descendentes jamais terem chance de qualquer redenção.
Se compararmos o reinado de Mary I com o de seu pai Henrique VIII e o de sua meia-irmã e sucessora Elizabeth I, veremos que Mary na realidade não era uma pessoa ruim. Ao executar de maneira cruel todas aquelas pessoas, Mary acreditava de maneira doentia e perturbadora que estava realizando a vontade de Deus na Terra, quando na verdade estava sendo manipulada por conselheiros mal intencionados que se aproveitaram de sua loucura e por um marido interesseiro que a desprezava e só estava interessado em assumir o controle do reino.
Na mídia podemos ter uma noção da história da rainha Mary I por meio de diversos livros históricos; em filmes como Elizabeth, de 1998, dirigido por Shekhar Kapur, com a atriz Kathy Burke no papel da rainha Mary; e no seriado The Tudors, do canal People & Arts, onde a jovem princesa Mary é interpretada pela atriz Sarah Bolger.
Escrever um artigo para o Bitch Power não foi fácil. Apesar de ser um artigo histórico espero não ter deixado ele nem muito chato nem muito cansativo. De qualquer forma agradeço imensamente a compreensão de todos e espero ter colaborado de alguma forma com a comunidade xenite. Um grande abraço a todos e até a próxima!