Mitologia

6 - 8 minutes readA Décima Musa: Safo

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OBardo

            Seguindo a lista de sugestões que recebi no fim de dezembro (quando, desesperada por não ter escolhido um tema para ser discutido aqui, pedi sugestão dos membros da UX), esse mês eu vou falar de Safo.
Espero que estejam com paciência para ler trechos de poemas…

            Para falar a verdade, eu não concordo em encaixar Safo como “mitologia, personagem mitológico”, uma vez que ela existiu de verdade. Porém, sua vida e obra possuem muitos detalhes que não se sabem se são verdadeiros, ou seja, existem lendas a respeito dela, que é a maior entre todas as poetisas gregas. E é por isso que eu aceitei a sugestão da Éris e da Vivianni para falar de Safo.

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Safo (em grego, Σαπφώ, transl. Sapphō) nasceu na ilha grega de Lesbos, na cidade de Eresos, por volta do ano 612 a.C. Ela é considerada a maior poetisa da Antiguidade, e provavelmente foi a primeira mulher a fazer poesia importante na cultura ocidental.

Pouco se sabe sofre a vida de Safo, e menos ainda sobre a sua aparência física, mas em alguns lugares diz-se que ela era sedutora, apesar de não se encaixar nos padrões de beleza da época (embora Sócrates a tenha chamado de “A Bela”). Ela era baixa, magra e tinha cabelos e olhos negros. Apesar disso, ela possuía um atrativo pessoal formidável (levando alguns a acreditar que ela poderia dominar feras com seu olhar). Mas essa não é a razão de sua fama.

Safo era de uma família rica e por isso pôde estudar poesia, retórica e dança. Mesmo pertencendo à aristocracia, eram poucas as possibilidades para uma mulher na época (quase tudo estava relacionado aos afazeres domésticos). Mas isso não era um empecilho para Safo: desde os 19 anos ela já participava da vida social de Lesbos, na política (segundo alguns), e principalmente através de suas poesias.

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Apesar de ter nascido em Eresos, Safo viveu maior parte de sua vida em Mitilene, cidade mais importante de Lesbos. Aos 19 anos ela passou a viver em Pirra, pois foi exilada, junto com outros aristocratas, acusados de ter participado de uma conspiração contra Pitaco (ou Pítaco), ditador de Lesbos na época. Outro poeta, Alceu, também participou da conjuração. Ele teria sido o mais notável poeta da época se não fosse justamente por Safo. No exílio, Alceu tentou namorar Safo, e conta-se que ele enviou-lhe um bilhete: “Oh pura Safo, de violetas coroada e de suave sorriso, queria dizer-te algo, mas a vergonha me impede”. A resposta de Safo: “Se teus desejos fossem decentes e nobres e tua língua incapaz de proferir baixezas, não permitirias que a vergonha te nublasse os olhos – dirias claramente aquilo que desejasses”. Alceu dedicou a Safo muitas odes e serenatas.

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Ilustração representando Safo

            Logo depois de voltar do exílio em Pirra, Safo foi novamente exilada, e dessa vez foi morar na Sicília. Lá ela se casou com um industrial, Cercolas, que lhe deu uma filha, Cleis. Ele morreu pouco tempo depois do casamento, deixando Safo viúva e rica. Cinco anos depois do segundo exílio, Safo volta a viver em Lesbos, onde se torna uma líder no campo intelectual. (E é aí que começa a parte que interessa a todos os Xenites, principalmente os subbers).

A Escola de Safo

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Safo, por Klimt

Safo fundou em Mitilene uma escola para moças, onde ela as ensinava música, poesia e dança. Essa foi considerada a primeira “escola de aperfeiçoamento” da História. As alunas eram chamadas de hetairai (amigas, companheiras), e logo começaram a surgir boatos em Mitilene sobre os costumes na escola, principalmente sobre Safo amar suas alunas. A primeira aluna a ter sido tirada da escola por conta dos boatos foi Atis – a favorita de Safo. Ela foi a maior amante de Safo, mas acabou se apaixonando por um moço, fato que causou muito ciúme em Safo. Por conta desse episódio, Safo escreveu o seguinte poema, traduzido para o português:

“Semelhante aos deuses parece-me que há de ser o feliz
mancebo que, sentado à tua frente, ou ao teu lado,
te contemple e, em silêncio, te ouça a argêntea voz
e o riso abafado do amor. Oh, isso – isso só – é bastante
para ferir-me o perturbado coração, fazendo-o tremer
dentro do meu peito!
Pois basta que, por um instante, eu te veja 
para que, como por magia, minha voz emudeça; 
sim, basta isso, para que minha língua se paralise, 
e eu sinta sob a carne impalpável fogo 
a incendiar-me as entranhas. 
Meus olhos ficam cegos e um fragor de ondas 
soa-me aos ouvidos; 
o suor desce-me em rios pelo corpo, um tremor (…)”

Essa parte grifada (por mim), inclusive, é a que deu origem ao suposto poema de Safo que Xena dá para Gabrielle em Many Happy Returns:

“Há um momento quando olho para você
Que eu fico sem palavras
A língua trava
Então um fogo corre sob a minha pele e eu tremo
Empalideço porque estou morrendo de tanto amor
Ou é assim que me sinto.”

            Após os boatos, a escola de Safo rapidamente se desfez, o que foi um duro golpe para a poetisa. Essa desgraça em sua vida, contudo, foi a faísca que deu início à explosão do talento de Safo, e é a partir daí que seus poemas mais consagrados foram escritos. O “Adeus à Atis” veio logo após, e até hoje esse poema é considerado um dos mais perfeitos versos líricos de todos os tempos, que foi modelo de estilo pela singeleza e sobriedade. Expressões que Safo usou para caracterizar Atis (como, “doce e amargo tormento”) foram depois muito utilizadas por poetas através dos tempos.

Segundo Ovídio, Safo voltou a gostar de homens na idade madura, e a lenda conta que, por causa de um amor não correspondido pelo marinheiro Faonte, ela se suicidou, pulando de um precipício na ilha de Leucas. No Livro de Ouro da Mitologia, de Thomas Bulfinch, em um capítulo dedicado aos poetas da antiguidade, o autor fala sobre esse episódio, acrescentando que a tradição popular diz que quem desse o “Pulo da Amante” (como ficou conhecido suposto final trágico de Safo), se não morresse, ficaria curado do seu amor. Porém, existem poemas que sugerem que Safo tenha atingido à velhice, o que torna o suicídio apenas uma lenda.

Honras e referências

Safo, por toda a sua genialidade poética, foi considerada uma dos chamados “Nove Poetas Líricos”, e assim como Homero era conhecido como “O Poeta”, Safo era conhecida como “A Poetisa”.

Também se conta que o ditador Sólon, que não gostava de poesia, ficou tão feliz em ouvir seu neto (ou sobrinho) declamando um poema de Safo, que disse que queria aprendê-lo e depois morrer.

No século III a.C. eruditos alexandrinos recolheram os poemas de Safo em uma coleção de 10 livros, mas durante a Idade Média, a maior parte foi queimada. Restaram apenas alguns versos, e mais outros foram encontrados em tiras de pergaminhos em um sarcófago. Apesar de poucos, os versos que resistiram à ação do tempo comprovam a genialidade e a beleza do estilo de Safo.

O maior reconhecimento, talvez, veio através de Platão, na frase:

Há quem afirme serem nove as musas. Que erro!
Pois não vêem que Safo de Lesbos é a décima?”

E, claro, o dicionário também foi enriquecido: a palavra lésbica, no significado usado atualmente, é nada mais que uma referência à Safo (para quem não entendeu a conexão: a palavra faz referência ao local onde Safo nasceu e viveu a maior parte de sua vida, Lesbos).

Para terminar esse artigo, mais uma parte dos versos de Safo que sobreviveram ao tempo, à hipocrisia, ao preconceito e ao fogo da Inquisição:

A Átis

Não minto: eu me queria morta.
Deixava-me, desfeita em lágrimas:

“Mas, ah, que triste a nossa sina!
Eu vou contra a vontade, juro,
Safo”. “Seja feliz”, eu disse,

“E lembre-se de quanto a quero.
Ou já esqueceu? Pois vou lembrar-lhe
Os nossos momentos de amor.

Quantas grinaldas, no seu colo,
– Rosas, violetas, açafrão –
Trançamos juntas! Multiflores

Colares atei para o tenro
Pescoço de Átis; os perfumes
Nos cabelos, os óleos raros

Da sua pele em minha pele!
[…]
Cama macia, o amor nascia
De sua beleza, e eu matava
A sua sede” […]

Cai a lua, caem as plêiades e
É meia-noite, o tempo passa e
Eu só, aqui deitada, desejante.

– Adolescência, adolescência,
Você se vai, aonde vai?
– Não volto mais para você,
Para você volto mais não.

 É isso por esse mês, Xenites. Espero que tenham gostado de conhecer um pouco mais dessa poetisa tantas vezes citadas nos fóruns Xenites. Se alguém tiver mais sugestões de matérias para Mitologia, é só me avisar! Até mês que vem!

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