Girl Power

4 - 6 minutes readQue a sorte esteja sempre com ela…

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…uma criança que não brinca no jogo da morte.

 

Por Alessandro Chmiel

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Twitter: @AleXenite

 

Fevereiro de 2013

 

 

Dedicado a Elaine Cristina, a Xenite que é fã voraz dessa série literária! 

 

Vamos lembrar daquele famoso tópico na popular comunidade do Orkut, “Eu confesso”? Bem, eu confesso que quando vi o primeiro livro de Jogos Vorazes nas prateleiras, pensei “ah, lá vem mais uma Bella Swan” (àqueles que esperam um artigo da mais nova senhora Cullen, sentem-se ali do ladinho da Cláudia, pois aqui é espaço de Girl Powers). Acontece que Katniss deve ter, no máximo, a mesma cor de cabelo. A guerreira desta história tem sede de vida, e fome de vitória para preencher o vazio da injustiça.

Katniss tem 16 anos e vive no Distrito 12, um dos 12 Distritos pertencentes a Panem, um distópico mundo em algum lugar do futuro. Conta-se que há um pouco menos de 100 anos, os Distritos se uniram contra a inescrupulosa Capital, que comandava todos os Distritos e retirava de cada um deles todo o necessário para uma vida de deuses e ambrosias no café da manhã – imaginem os estados brasileiros se rebelando contra o Distrito Federal para derrubar a marginália toda. A derrota dos Distritos não foi surpresa para a Capital, tamanho poder que constituíam. A revolução gerou muitas mortes e destruição, especialmente nos Distritos, ainda mais pobres depois da devastação. Como o severo Zeus penitenciando os mortais, a Capital decide castigar os Distritos de modo a agradar seu “traumatizado” povo da Capital: é criado os Jogos Vorazes.

Os Jogos, uma espécie de reality show à la Mortal Kombat, envolvem 24 competidores, um menino e uma menina de cada Distrito para se digladiarem em arenas distintas, até que reste apenas um – ou uma – respirando. E não é como o BBBaixaria para o qual é necessário no mínimo 18 anos para mostrar que ainda se é infantilóide: os participantes são sorteados entre pessoas de 12 a 18 anos, sem chance de negarem a entrada na carnificina a não ser que alguém se voluntarie em seu lugar. A ideia dos JV é relembrar as gerações dos Distritos do que ocorreu, lembrando-os de quem realmente está no poder, punindo os filhos da nação de Panem, obrigando a população a assistir, ao vivo, o massacre de seus jovens e pequenos.

Após sete décadas de Jogos, a 75ª edição convoca um menino, Peeta Mellark, e uma pequena menina, Primrose Everdeen, para competirem pelo Distrito 12. Acontece que esta menina é ninguém menos que a irmã mais nova de Katniss Everdeen, que se voluntaria para ir no lugar da irmã. Uma bravura de cortar o coração. Mas por que Katniss teria mais chances de sobrevivência na arena do que sua irmãzinha?

Katniss desde cedo sabia da lamentável situação de sua família e de seu Distrito, e volta e meia invadia os terrenos proibidos ao redor da área 12 para caçar, ao lado de seu amigo Gale Hawthorne. Para tanto, a menina aprendeu táticas de sobrevivência na mata, assim como mover-se sorrateiramente e caçar com seu arco e flechas – herança de seu pai falecido num acidente nas minas do Distrito. Mesmo sem grandes expectativas, Katniss não cairia sem lutar.

As habilidades dessa Girl Power não impressionam apenas os julgadores dos Jogos, mas especialmente ao leitor pela ousadia. Suzanne Collins, a autora norte-americana dos três livros da série, consegue habilmente nos envolver na narrativa de Katniss, abismar-se pela grandiosidade esmagadora daquela realidade sem escapatória, onde qualquer deslize é uma sentença de morte.

O torneio é uma situação sem honra – não há glória matando iguais, jovens tão vítimas como você de uma tragédia há tanto tempo ocorrida, mas todos os anos forçosamente lembrada. Mesmo sendo enaltecida pela sua fantasia de chamas vivas no evento de apresentação, dentro do coliseu virtual Katniss é apenas mais uma mortal enfrentando a fome, as dores, o frio, e as ameaças naturais ou dos outros competidores, e principalmente, daqueles que controlam o jogo.

 

É claro que um Xenite já quer logo saber o que há de tão especial nessa guerreira. Com Xena, Katniss é tão dura na queda quanto ela, e mostra ao longo dos livros que estratégia pode ser muito mais letal do que braços fortes e armas pesadas. E como toda Xena que se preze, a guerreira do Distrito 12 possui aliados dentro e fora da arena, o que torna a personagem engrandecida e mostra bastante de seu nobre coração. Já com Gabrielle, além da crença de que o mundo pode, sim, se transformar num lugar mais pacífico, seu estilo de combate amazona é a maior referência à nossa barda guerreira – ainda que Gabrielle pouco use de um arco, ela sempre será uma Rainha Amazona.

 

Katniss Everdeen vai além de uma sobrevivente: ela carrega o símbolo de todos os oprimidos, das incontáveis famílias sem voz que, pouco a pouco, perdem sua humanidade em reverência ao absolutismo e onipotência de poucos claramente deslavados de compaixão. Não é por menos que seu símbolo é o tordo, o pássaro que faz reverberar sua voz para ser ouvida e repetida por todos. Assim, Katniss, por si só, é símbolo de bravura, de fogo na alma, de esperança… de revolução. Ela é o espelho de quem deseja alcançar mais do que a vida nos oferece a princípio.

Os livros (Jogos Vorazes; Em Chamas; A Esperança) são claras críticas à mídia violenta e sensacionalista, debochando na cara da aniquilação humana. Assim como XWP, num primeiro momento pode-se achar que é entretenimento infantil (!), mas logo se percebe que, para ser vitorioso num jogo da morte, a fruta precisa amadurecer antes da hora – e fazer de tudo para não ser devorada.

A tradução das versões brasileiras ficaram a cargo de Alexandre D’Elia (confira uma entrevista com ele sobre a experiência de traduzir as obras AQUI). A adaptação cinematográfica é maravilhosa, porém não muito rica em detalhes narrativos. Só mesmo lendo o livro para compreender todo o desenlace da trama. O filme de 2012 conta com a direção de Gary Ross e adaptação de roteiro da própria Suzanne Collins. A atriz Jennifer Lawrence dá vida a Girl Power Katniss, numa atuação digna da personagem brilhante. O segundo filme tem previsão de lançamento ainda este ano.

Estou feliz de estar em casa outra vez. Grande abraço de gigante em vocês!

 

 

 

 

5 Comments

  • Lorenzo

    Impressionante ! Eu imaginava mais um boccozístico apocaliptico pós mortal combat, komite e outros besteiróis de luta em arenas intergalácticas (inteligencia artificial e cia) e tu trouxeste uma gama de aspectos que valem a pena serem vistos. Revendo conceitos, buscarei os livros com mais ansiedade ! Parabéns Chmiel.

  • renata

    Depois de ler seu artigo me deu vontade de ler os livros e assistir ao filme, com certeza vou fazer isso brevemente.
    E quem disse que a história é infantil, não entendeu nada, ao que me parece.

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